Pseudo-ineditismo de clássicas experiências novas

Todos de cativeiro. Nem eram tão novidade assim aquelas barras de ferro. Alocadas em fileira meticulosa de verticais, limitação rítmica pelo padrão de espaçamento, de forma que se pudesse passar um braço ou uma perna, mas nunca o crânio, sem que se evitassem os traumas e concussões. Elas, evidentemente, percorriam toda a extensão física, demarcando-a; embora que, com o tempo, tenham se expandido à restrição visual e de intenções.


Ali, por comprimento-altura-largura, poderia acolher uma dúzia dos maiores elefantes indianos, mas fazia vez de abrigo a cinco jovens de crespos pêlos cor de azeitona. Todos tinham a mesma idade e o mesmo porte físico.

Acontece que, para os de fora, se fez por bem acrescentar ao ambiente alguns adornos: uma escada de alumínio e borracha negra fora encostada à parede do fundo, em cujo cume acomodou-se um frondoso cacho de banana-prata. Ali estava, aos inquilinos, uma estrada de paralelas e perpendiculares que levavam direto ao céu. O vértice da parábola de qualquer existência: recompensa máxima; esforço mínimo. A Pasárgada dos primatas.

Entretanto, o que a malícia deles não permitia perceber era a existência, conectado à escada, de um sistema de captação de impulsos, que percebia o contato, por mais ligeiro que fosse, no degrau. Material de última geração, sem dúvida. Acontece, também, que esse aparelho, ao notar a interação táctil, ativava automaticamente o equipamento anti-incêndio adaptado, ensopando por quinze longos minutos todos os pobres residentes.

Quando o primeiro se antecipou aos outros, frente à recompensa em carboidratos e potássio, o danado do sistema tratou de esguichar uma água tão forte e gelada, que fazia, sem pena, à meia dezena, os calafrios ressoarem em uníssono. Com o susto, o prodígio escorregou da escada antes que alcançasse o laurel. Na segunda tentativa, novamente frustrada com outra sessão de tortura glacial, seus co-habitantes perceberam o elo entre sua ambição e os banhos, e trataram de aplicar-lhe uma tremenda sova. Para aprender, é claro.

Ficou estabelecido, portanto, que se qualquer ser-respirante daquele recinto ousasse tentar consumir as bananas, e isso provocasse o encharcamento dos pêlos – que por espessos que fossem, não eram impermeáveis – seria prontamente penalizado com os mais vibrantes cascudos, beliscões, pontapés e bordoadas. Com direito a músculo, unha, pau e pedra.

Pelos dias, o cacho de frutas enegrecidas era trocado por um novo, ainda maior, mais bonito e suculento. Não satisfeitos, os de fora resolveram então substituir uma das famigeradas cobaias por outro animal também da mesma espécie, idade e porte. O novato, coitado, assim que adentrou no lar, encantou-se com as bananas e se danou a tentar fazê-las jantar. Foi devidamente castigado, óbvio.

Em manhãs seguintes, outro residente antigo foi substituído por um novo, com as mesmas qualidades em genes, volume e primaveras. O processo se repete: deslumbrado com a magnitude do cacho, o calouro tenta devorá-lo e termina por apanhar de todos, inclusive do primeiro novato, que aproveita para descarregar toda a angústia do seu batismo.

E assim foi até o momento em que só restara um único que, outrora, sentiu na pele (espero que o caráter denotativo redima a falta de capricho metafórico, por não se tratar de uma) o preço da ousadia. Acontece que, no dia em que o derradeiro foi substituído, o ciclo não minguou; a pancadaria virara estribilho. O quinto novato terminou espancado pelos outros quatro que, faço questão de lembrar, nunca haviam tomado um banho sequer.

Dois anos depois da primeira tentativa frustrada da safra inicial, e após sete trocas completas de elenco e algumas dezenas de cachos, todos os recrutas e veteranos são agredidos à menor manifestação de vontade em se aproximar da escada, embora sem que ninguém tenha, ao menos, tocado-a nos últimos vinte e cinco meses.

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