diário exercício da desconfiança

04 de março,

Achei uma aranha minúscula dentro do meu livro. Num impulso de malvadeza, aproximei meu cigarro da aranha que se pôs a correr freneticamente. Coloquei o cigarro aceso à sua frente, ela mudou de rota. Repeti o ato várias vezes até a aranha se imobilizar. Deixei-a sossegada por um tempo. Num novo impulso, aproximei o cigarro aceso por cima, e ela voltou a correr. Continuamos assim por uns dois minutos. Ela então cansou, encolheu as pernas e tornou-se imóvel mesmo sem ter sido tocada pela brasa do cigarro.

É possível que, para essa aranha, o tamanho do livro seja o do Japão, e cinco minutos sejam cinco ou dez anos. Durante esse período, e nesse espaço, onde quer que ela fosse, havia fogo. E quando ela parou, o fogo veio de cima... Se isso acontecer a um ser humano, ele enlouquece. A aranha não entendia de onde vinha aquela chama. Seres humanos também perdem.

Desejo me tornar um homem capaz, mesmo que a grande custo. Capaz de identificar objetivamente a causa do problema, e transmitir esse conhecimento à geração seguinte. Feito isso, posso morrer. Através da alegoria da aranha traço um retrato doloroso do povo japonês nestes tempos de guerra – sem entender o que ocorre, ele corre sem rumo, em busca de uma saída para a situação impossível causada pela guerra.

- Sasaki Hachiro, 22 anos





“Quando a operação tokkotai foi criada, em outubro de 1944, nem um único piloto oficial treinado nas academias militares japonesas se apresentou como piloto voluntário – todos sabiam que se tratava de missões suicidas.

Os 'voluntários' foram perto de 3 mil 'meninos-soldados', nome dado às levas de adolescentes recém-recrutados como parte do esforço de guerra. Outros mil eram 'soldados-estudantes', universitários formados às pressas pelo governo para entrar nas fileiras militares. (...) Eles eram cosmopolitas e cultos, dados a reflexões profundas, fruto do exigente currículo escolar japonês. Era obrigatório o estudo de duas línguas estrangeiras, além do latim.'”

Revista Piauí, 61

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